PARÁBOLA DO ADMINISTRADOR INFIEL

Por Roberto Watanabe

Como todos sabemos, Jesus nos trouxe boa parte de seus ensinamentos sob a forma de parábolas e alegorias, todas baseadas em fatos e situações da vida cotidiana. Essas narrativas primam pela sua beleza e simplicidade, carregando em seu âmago uma série de preceitos morais da mais alta importância a todo aquele que queira erigir o Reino de Deus em seu coração. É natural que apreciemos mais esta ou aquela parábola, seja pela estória em si, seja por calar mais fundo em nosso íntimo. Quanto a nós, havemos de reconhecer que nos toca mais de perto a Parábola do Administrador Infiel (Lucas 16-1-16), na medida em que nos identificamos com a personagem criada pelo Mestre. Dito isso, passemos a um breve relato da parábola.

Um homem rico convoca o seu administrador para que lhe preste contas antes de ser demitido, pois recebera a denúncia de que este dissipara os bens que lhe fora confiado. Face a uma situação futura de penúria, pois não conhecia outro ofício, o administrador traça um plano para que houvesse quem o recebesse em sua casa, após a iminente demissão. Chama então os devedores de seu patrão, um por um, e lhes reduz as dívidas substancialmente. E o homem rico então se admira da astúcia do administrador. Ao que Jesus conclui, com a seguinte recomendação: "Eu vos digo: fazei-vos amigos com as riquezas injustas, para que, no dia em que ela vos faltar, eles vos recebam nos tabernáculos eternos" (Lucas, 16-9).

A primeira vista, esta narrativa nos causa uma certa estranheza, pois nos parece que Jesus tece um elogio a alguém que fora infiel na administração dos bens de seu senhor. Estaria o Mestre, por acaso, exaltando a desonestidade? É evidente que não, pois o que Ele faz é simplesmente expor uma situação que é, talvez, a da maioria de nós, Espíritos que ainda avançam vacilantes na sua senda evolutiva. Vejamos porque este é o caso.

Sabemos que, nos ensinamentos de Jesus, a figura do senhor ou do patrão é sempre uma representação de Deus. E quanto ao administrador infiel e aos bens que este dissipara? A princípio, o ad- ministrador infiel é todo aquele que administra mal os bens materiais de que dispõe e que não lhe pertencem de fato, pois, conforme nos lembra Fénelon, "o homem, sendo o administrador dos bens que Deus lhe depositou nas mãos, severas contas lhe serão pedidas do emprego que lhes dará, em virtude do seu livre arbitrio" (O Evangelho segundo o Espiritismo, Cap. XVI, 13). E administrar mal, neste caso, é dissipar os bens em atos pródigos que visam apenas à satisfação pessoal, ou então reter os bens numa atitude de avareza indiferente às necessidades do próximo ou da coletividade.

Mas os bens que Deus nos deposita nas mãos, e que malversamos, não se restringem àqueles de natureza material, pois incluem também as posições de poder e de prestígio que utilizamos na exploração ou na humilhação do próximo, os dons da inteligência que aplicamos exclusivamente no interesse próprio ou para desviar mentes e corações do caminho correto, a saúde que dissipamos nos prazeres ou na ociosidade, enfim, a própria vida que não sabemos valorizar adequadamente. E se porventura não agimos dessa forma na atual existência, é muito provável que o tenhamos feito em existências anteriores, pois, senão, como explicar o fato de ainda estarmos a labutar neste mundo de expiação e provas?

As consequências da malversação dos bens que a Divina Providência nos confia são os diversos padeci- mentos que nos assolam, sejam a angústia e a melancolia, as neuroses e psicoses, as enfermidades de longo curso, os fracassos nos empreendi- mentos e as situações de penúria, etc. Como nos lembra Allan Kardec, "o homem sofre sempre a consequência das suas faltas; não há uma única infração à lei de Deus, que não tenha a sua punição" (Evangelho segundo o Espiritismo, Cap. XXVII, 21).

 

Todavia, não é somente pela dor que podemos resgatar as nossas faltas, e é isso exatamente que a parábola quer nos mostrar. Notem que, diante da demissão iminente, o administrador procurar angariar o favor dos devedores de seu patrão, para que estes o ajudassem nos momentos de necessidade. Da mesma forma, aqueles de nós que tenham malversado os bens do Pai da Vida, seja nesta ou em existências anteriores, podemos aplicar da melhor forma possível os recursos de que ora dispomos, buscando angariar amigos que intercedam por nós junto aos tabernáculos eternos.

Assim, os que detenham vultosos recursos materiais, podem propiciar o trabalho que dignifica; os que ostentam saúde vigorosa, podem se dedicar ao labor honesto e edificante; os que desfrutam da luz da inteligência, podem difundir conhecimentos e valores de forma saudável, os que dispõem de poder e prestigio, podem agir tendo em vista sempre o bem da coletividade; os ofensores de ontem, podem, pela paciência e humildade, fazer dos antigos desafetos os amigos de hoje, e assim por diante.

Por aí podemos notar a oportunidade ímpar que a Misericórdia Divina sempre nos oferece, para que possamos desfazer as nuvens sombrias que obscurecem nossas existências, conduzindo-nos, ao mesmo tempo, à luz do amor e da compreensão. É necessário, no entanto, termos plena consciência de nossa real condição, pois conforme nos lembra André Luiz: "O pretérito fala em nós com gritos de credor exigente, amontoando sobre as nossas cabeças os frutos amargos das plantações que fizemos..." (Ação e Reação, Capitulo 2).

E preciso, também, que nos vigiemos constantemente face a possíveis recaídas, e que busquemos na prece a força e a paciência para podermos perseverar nos propósitos retificadores. É necessário, enfim, que não nos imobilizemos na apatia ou no sentimento de culpa e que, ao contrário, sigamos adiante, amparados nos preceitos do Divino Pastor consubstanciados nas claridades da Doutrina Espírita, cientes de que: "a quem muito foi dado, muito será pedido, e ao que muito confiaram, mais contas lhe tomarão". (Lucas, 12:48).

Fonte: O Semeador



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