Antonio Carlos Piesigilli
Somos Espíritos animando, temporariamente,
corpos de matéria densa. Nosso corpo físico é instrumento importante para,
vivendo na Terra, praticarmos o Bem a quem quer que seja e aprendermos
importantes lições para nossa evolução moral e intelectual. Contudo, não somos
nosso corpo, como nosso corpo físico não é a roupa que vestimos. Todos nós, um
dia, teremos de deixar esse equipamento de matéria densa, por ocasião da morte
do corpo físico.
Quanto mais cientes, no raciocínio e no
sentimento, de que não somos nosso corpo, mas sim Espíritos imortais; e,
principalmente, quanto mais tivermos praticado o Bem ao próximo — também
aprendendo, por esse bom hábito, que as pessoas importam mais que as coisas —,
mais breve e tranquilo será nosso período de adaptação à vida em ambiente de
matéria quintessenciada.
E essa prática do Bem independe do credo que
se professe, desde que essa crença tenha por princípio a caridade, ou seja, o
amor ao próximo na prática, sem impor condições e sem esperar nada em troca.
Allan Kardec, o Codificador da Doutrina
Espírita, denominou esse período de adaptação, entre a saída da encarnação e o
retorno à vida no mundo espiritual, de perturbação. O tema está abordado nas
questões 163 a 165 de “O Livro dos Espíritos”. Kardec indaga os Espíritos da
Falange do Consolador sobre se o conhecimento do Espiritismo auxilia nesta
etapa de adaptação, obtendo as seguintes orientações:
O conhecimento do Espiritismo exerce alguma
influência sobre a duração, mais ou menos longa, da perturbação?
“Influência muito grande, por isso que o Espírito já antecipadamente compreendia a sua situação. Mas, a prática do bem e a consciência pura são o que maior influência exercem.” [1]
“Influência muito grande, por isso que o Espírito já antecipadamente compreendia a sua situação. Mas, a prática do bem e a consciência pura são o que maior influência exercem.” [1]
Considerando que o período de perturbação
espiritual guarda estreita relação com o grau de adiantamento do Espírito (“O
Livro dos Espíritos”, questão 164), pode-se evidenciar que a prática do Bem, ou
seja, da caridade, é ainda mais importante que o saber apenas intelectual.
Observemos a situação dos Espíritos Benévolos
(quinta classe, item 108 de “O Livro dos Espíritos”, na Escala Espírita,
proposta pelo Codificador, entre os itens 100 e 113 de “O Livro dos
Espíritos”). Esses Espíritos, classificados como de segunda ordem, ou seja,
Espíritos Bons, apresentam como característica o maior desenvolvimento moral do
que o intelectual.
Como exemplo, podemos citar o desligamento da
personagem Adelaide, narrado por André Luiz no livro “Obreiros da Vida Eterna”
[2], que demonstra o quanto a prática da caridade pode auxiliar neste momento:
“Felizmente, porém, nossa querida Adelaide
não dará trabalho. O ministério mediúnico, o serviço incessante em benefício
dos enfermos, o amparo materno aos órfãos nesta casa de paz, aliados aos
profundos desgostos e duras pedradas que constituem abençoado ônus das missões
do bem, prepararam-lhe a alma para esta hora… (…)
– Aliás, cumpre-nos destacar as condições
excepcionais em que partirá nossa amiga. Em tais circunstâncias, apenas lastimo
aqueles que se agarram em demasia aos caprichos carnais. Para esses, sim, a situação
não é agradável, porquanto o semeador de espinhos não pode aguardar colheita de
flores. Os que se consagram à preparação do futuro com a vida eterna, através
de manifestações de espiritualidade superior, instintivamente aprendem todos os
dias a morrer para a existência inferior.”
A Doutrina Espírita propõe desmistificar a
morte do corpo físico, demonstrando que já passamos por essa experiência muitas
vezes; e, periodicamente, por misericórdia de Deus, recebemos oportunidades de
retornar à Terra para apreender lições e auxiliar o próximo, até completarmos
nosso aprendizado neste planeta e seguirmos nossa caminhada evolutiva em mundos
mais avançados.
Contudo, o Espiritismo não professa que só
quem for espírita “será salvo”, ou seja, evoluirá.
Na Revista Espírita de outubro de 1866, no
item denominado “Os Tempos São Chegados”; bem como em “O Evangelho Segundo o
Espiritismo”, Capítulo XV (“Fora da Caridade não Há Salvação”), demonstra-se o
entendimento da Doutrina Espírita a esse respeito. Kardec ressalta o caráter
progressivo do Espiritismo (abordado na postagem “Hermenêutica, Exegese e
Espiritismo”, neste blog), como o é a Ciência terrena. É preciso sejamos
humildes e conscientes de não possuir o entendimento completo da verdade, da
qual somente Deus é pleno possuidor. Devemos sempre buscar aprender e
compreender melhor a vida e o Universo. Reproduzimos trecho do capítulo citado
de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”:
“A máxima — Fora da caridade não há salvação
consagra o princípio da igualdade perante Deus e da liberdade de consciência.
Tendo-a por norma, todos os homens são irmãos e, qualquer que seja a maneira
por que adorem o Criador, eles se estendem as mãos e oram uns pelos outros. (…)
O Espiritismo, de acordo com o Evangelho,
admitindo a salvação para todos, independente de qualquer crença, contanto que
a lei de Deus seja observada, não diz: Fora do Espiritismo não há salvação; e,
como não pretende ensinar ainda toda a verdade, também não diz: Fora da verdade
não há salvação, pois que esta máxima separaria em lugar de unir e perpetuaria
os antagonismos.” [3]
O Codificador, questionando objetivamente os
Espíritos Superiores acerca deste tema, foi assim esclarecido:
Será necessário que professemos o Espiritismo
e creiamos nas manifestações espíritas, para termos assegurada a nossa sorte na
vida futura?
“Se assim fosse, seguir-se-ia que estariam
deserdados todos os que não creem, ou que não tiveram ensejo de esclarecer-se,
o que seria absurdo. Só o bem assegura a sorte futura. Ora, o bem é sempre o
bem, qualquer que seja o caminho que a ele conduza.” [4]
Concluímos com o comentário de Kardec sobre a questão acima mencionada, ressaltando a liberdade de consciência e foco no Bem, professados pela Doutrina Espírita.
“A crença no Espiritismo ajuda o homem a se
melhorar, firmando-lhe as ideias sobre certos pontos do futuro. Apressa o
adiantamento dos indivíduos e das massas, porque faculta nos inteiremos do que
seremos um dia. É um ponto de apoio, uma luz que nos guia. O Espiritismo ensina
o homem a suportar as provas com paciência e resignação; afasta-o dos atos que
possam retardar-lhe a felicidade, mas ninguém diz que, sem ele, não possa ela
ser conseguida.”
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